O VESTIDO DE NOIVA
Crônica, 2010



                                    
© Neyde Lantyer. Saudade Dress (after Louis Bourgeios and Keith
Edmier)
, 2010. Collage. 
Minha mãe se casou em casa, na capela do Chalet, vestida de cor-de-rosa. Não há fotos da cerimônia. Imagino meu avô circunspecto e meu pai tímido. Especialmente, imagino minha mãe vulnerável. Todos emocionados. Imagino tambem que aquela não fora a cerimônia dos seus sonhos, embora ela nunca tenha falado sobre isso desta maneira. Nunca se queixou por não ter se casado na igreja. Na verdade não pensava nisso. Muito tempo depois, quando já tinha quase 30 anos, encontrei a certidão de casamento e descobri que minha mãe já estava grávida quando se casou. Grávida de mim. Minha avó de criação ficou com as roupas de solteira, os vestidos de baile, os conjuntos de cintura justa e as saias semi-longas de minha mãe, alem do vestido de noiva. Tinha a mania de desmanchar roupas antigas para fazer outras que nunca eram concluídas. Assim o vestido de noiva foi desmembrado. Cheguei a divisar o corpete, as mangas, pedaços da barra da saia, amassados em certa gaveta de costura. Não sei se tinha véu, laço, flor. Nunca consegui imaginar como teria sido o modelo que minha mãe usou na cerimônia em que estive sigilosamente presente. Só sei do tecido, uma espécie de seda de um rosa antigo muito suave, pontilhado de delicadas fibras prateadas que piscavam minúsculas, como poeira de estrelas.